quarta-feira, agosto 29, 2007

Muito Melhor que Bukowski

"Que noite boa, porra, que noite boa! Que horas serão? Qualquer
hora amanhece e vou ter de tirar os livros, e ir à luta. Ir à luta.
Não se pode baixar a guarda. Por isso me nocautearam aquela
vez. Porque eu baixei a guarda." (no capítulo: TEM SEMPRE UM
FILHO DA PUTA POR PERTO)

"Agora estou fodido, mas ninguém me tira o que já vivi!"

"Sobreviver, creio que se chama isso. Deixar-se deslizar e
não esperar nada mais. Muito fácil."

"Eu não queria me apaixonar de novo. Já estava cheio
do amor. O amor implica docilidade e entrega. Eu não podia
continuar sendo dócil, nem podia me entregar a nada, nem
a ninguém."

"Dessa forma, um exibicionista (...) cumpre uma bela função social:
excitar os transeuntes, tirando-os por um momento de seu stress
rotineiro, recordando-lhes que apesar de tudo somos apenas uns
animaizinhos primários, simples e frágeis. E, sobretudo, insatisfeitos.
(no capítulo: EU, REVOLVEDOR DE MERDA)

Pedro Juan Gutiérrez vivendo sobre escombros, Trilogia Suja de Havana.

segunda-feira, agosto 27, 2007

Em Cartaz Nova Turbulência

Traduzir-se [Ferreira Gullar]

Uma parte de mim é todo mundo
Outra parte é ninguém,
fundo sem fundo.

Uma parte de mim é multidão
Outra parte estranheza e solidão
Uma parte de mim pesa, pondera
Outra parte delira

Uma parte de mim
Almoça e janta
Outra parte se espanta

Uma parte de mim é permanente
Outra parte se sabe de repente
Uma parte de mim é só vertigem
Outra parte linguagem

Traduzir uma parte na outra parte
Que é uma questão de vida e morte
Será arte?

quinta-feira, agosto 16, 2007

"E ELA RODOPIAVA AO SOM DE UMA ESTRELA DANÇANTE, AO SOM DE UM SILÊNCIO TRISTE:

Eu vou ter tanta saudade de mim quando eu morrer." [A hora da estrela - Clarice Lispector]

Eu vos digo: é preciso ainda caos dentro de si, para poder dar à luz uma estrela dançante.
Eu vos digo: há ainda caos dentro de vós. [Assim falou Zaratustra - Friedrich Nietzsche]

sexta-feira, agosto 10, 2007

Estranheza

Essa seria a palavra,
resumindo o sentimento provocado pela falta que faz
aquele que não foi e que não sabemos se vai voltar.

"Saudade é um pouco como fome.
Só passa quando se come a presença.
Mas às vezes a saudade é tão profunda
que a presença é pouco: quer-se absorver
a outra pessoa toda (...)"

Clarice Lispector costumava dizer isso sobre o tema,
acho que me convenceu.

terça-feira, agosto 07, 2007

Em cartaz catarse

Mais um da novela Se Eu Fosse Eu, um dia ainda em cartaz catarse:


Eu


Eu sou a tangência de duas formas opostas e justapostas

Eu sou o que não existe entre o que existe.

Eu sou tudo sem ser coisa alguma.

Eu sou o amor entre os esposos,

Eu sou o marido e a mulher,

Eu sou a unidade infinita

Eu sou um deus com princípio

Eu sou poeta!



Eu tenho raiva de ter nascido eu,

Mas eu só gosto de mim e de quem gosta de mim.

O mundo sem mim acabaria inútil.

Eu sou o sucessor do poeta Jesus Cristo

Encarregado dos sentidos do universo.

Eu sou o poeta Ismael Nery

Que às vezes não gosta de si.



Eu sou o profeta anônimo.

Eu sou os olhos dos cegos.

Eu sou o ouvido dos surdos.

Eu sou a língua dos mudos.

Eu sou o profeta desconhecido, cego, surdo e mudo

Quase como todo o mundo.



1933




Ismael Nery, Auto-retrato, 1925
Às vezes superestimamos nossa capacidade de guardar segredo, compartilhar
as aflições alheias sem que essas acabem por devorar nossas próprias entranhas.

quarta-feira, agosto 01, 2007

Um e Outro

Na polarização inerente
a um e outro
O muro se apresenta
como condição necessária
para a garantia de aproximação
mas a pedra do muro
Não garante a permanência
Ela não está posta
Portanto, pode ser retirada*.



*Entendo por não estar "posto" algo que está sendo construído [sempre em relação a algo], não definitivo e que, portanto, pode ser retirado.

Tu não te moves de ti

" Prá onde vão os trens, meu pai?
Para Mahal Tami, Cam rí, espaços no mapa, e depois o pai ria:
também prá lugar algum meu filho, tu podes ir e ainda que se
mova o trem tu não te moves de ti. " (Tu não te moves de ti - Hilda Hilst)

Esse trecho era cantarolado como um mantra na peça Matamoros [da fantasia]
em cartaz no CCBB, com um ótimo elenco como Luiz Päetow num papel que lhe cai muito bem, Maria Alice Vergueiro, entre outras e que termina no próximo domingo dia 05/08.
A peça faz reflexões bem bacanas com um texto muito bonito de Hilda Hilst que faz parte da chamada vertente transgressiva de Hilda, trata-se de um conto dentro do livro Tu não te moves de ti, aqui deixo algumas impressões.
Fica minha recomedação num cantinho escuro e desconhecido como esse.
As impressões...

Correr o risco. de ser devorado.

Em uma das passagens, mãe Haiaga faz uma comparação entre pássaros e pessoas, que se forem tratados com carícias e cuidados deixam de querer buscar o infinito.
O Homem [Meu] faz reflexões interessantes sobre Deus e o Diabo: quando nos aproximamos do segundo ele quer logo que esqueçamos da nossa alma, e quando nos aproximamos de Deus ele quer logo que esqueçamos do nosso corpo, da nossa carne.
Como conciliar ambos?
"Apenas três noites de amor com seu pai. Filha, só três noites de amor."
"Vocês estão achando tudo isso putaria ou metafísica, não é. Obsceno. O que foi que eu disse? Obsceno. As palavras dão muito peso às coisas." [e pára de falar]

" Um poema
não se explica
É como um soco
E se for perfeito
te alimenta para
toda a vida "

[Hilda Hilst]