quarta-feira, outubro 18, 2006

A Vela da Agonia

Oswald..Oswald..nada ultrapassado! Recortes selecionados aleatoriamente-intencionalmente...

O REI DA VELA [Oswald Andrade]

ABELARDO I
[...] Nós dois sabemos que milhares de trabalhadores lutam de sol a sol para nos dar farra e conforto. Com a enxada nas mãos calosas e sujas.

HELOÍSA
[...]E você não teme nada?

ABELARDO I
Os ingleses e americanos temem por nós. Estamos ligados ao destino deles. Devemos tudo, o que temos e o que não temos. [...]

E sintetiza:
ABELARDO I
...Os países inferiores têm que trabalhar para os países superiores como os pobres trabalham para os ricos. Você acredita que Nova York teria aquelas babéis vivas de arranha-céus e as vinte mil pernas mais bonitas da terra se não se trabalhasse para Wall Street de Riberão Preto à Cingapura, de Manaus à Libéria? Eu sei que sou um simples feitor do capital estrangeiro. Um lacaio, se quiserem! Mas não me queixo. É por isso que possuo uma lancha, uma ilha e você.... (...)

HELOÍSA
Ficaste o Rei da Vela!

ABELARDO I
Com muita honra! O Rei da Vela miserável dos agonizantes. O Rei da Vela de sebo. E da vela feudal que nos fez adormecer em criança pensando nas histórias das negras velhas... Da vela pequeno-burguesa dos oratórios e das escritas em casa.... As empresas elétricas fecharam com a crise... Ninguém mais pôde pagar o preço da luz... A vela voltou ao mercado pela minha mão previdente. Veja como eu produzo de todos os tamanhos e cores. Para o Mês de Maria das cidades caipiras, para os armazéns do interior onde se vende e se joga à noite, para a hora de estudo das crianças, para os contrabandistas no mar, mas a grande vela é a vela da agonia, aquela pequena velinha de sebo que espalhei pelo Brasil inteiro... Numa páis medieval como o nosso, quem se atreve a passar os umbrais da eternidade sem uma vela na mão? Herdo um tostão de cada morto nacional! (...)

ABELARDO II
Só se pode prosperar à custa de muita desgraça. Mas de muita mesmo...

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